Quando ele poderia imaginar uma coisa
dessas?
Nunca!
Nunquinha da silva! – pensou com a convicção forte o
bastante para arrancar-lhe um gemido.
Olhou pela fresta da persiana da janela
da sala: sol alto, as pessoas cuidando da vida. E ele ali, de cueca, segurando
as roupas nas mãos, ainda assonado, e sem saber como escapar sem ser percebido.
Sempre que ia à casa da amante, chegava
tarde e saía bem cedo, antes de qualquer um estar saindo para o trabalho.
Justo naquele dia, perdera a hora e,
como um verdadeiro preguiçoso, dormira até quase a hora do almoço.
O celular sem bateria não tocara no
horário certo e sua amada saíra no horário de costume para trabalhar, de modo
que acordara com um barulho de buzina.
Como faria agora para sair sem ser
reconhecido? E como justificaria a falta ao trabalho? E como... - Dá um tempo, cara! Deixe, pelo menos, que eu
acorde! – disse a si mesmo em tom severo.
De tênis, bermuda e camiseta regata não
conseguiria andar cem metros sem ser reconhecido, evidentemente.
Certo que ela já estava viúva há um
tempo e ele era solteiro, mas ainda não se sentia suficientemente amadurecido
na relação – como em todas as outras, talvez. Foi até o baú do viúvo, que
ficava num quartinho nos fundos e o revirou.
Fez uma pescaria e conseguiu montar um
disfarce. Podia até não combinar muito, mas estava legal: uma calça de
poliéster clara, uma blusa de moletom com capuz, até um par de óculos escuros
encontrou.
Saiu sorrateiramente pelo portão lateral
em passo acelerado rumo ao metrô.
Havia uma grande agitação na rua em
função do jogo do Brasil que abriria a disputa de futebol na Olimpíada, e teve
isto como um facilitador.
Como a estação ficava a menos de duas
quadras da casa de onde acabara de sair, rapidamente alcançou a escada rolante
que o levaria para a plataforma de embarque.
Sentiu-se mais seguro já loa embaixo,
com o capuz ainda puxado sobre a cabeça, apesar do imenso calor, mas nada
abalava seu bem-estar. Estava protegido. Mais um pouco ele poderia ficar mais à
vontade.
Entrou no trem e sentou-se no fundo do
carro, distribuindo rápidos olhares na tentativa de identificar algum rosto
conhecido e não reconheceu ninguém.
Tinha colocado seus tênis e a roupa numa
mochila, mas como ela ficara muito vazia, achou por bem colocar mais algumas
roupas para fazer volume. Jogou uma maçã também, que iria come no caminho.
Foi pensando justamente na fruta,
fazendo o movimento de remexer na mochila, que foi brutalmente agarrado nas
mãos e pescoço e teve sua cabeça socada contra a parede.
Começou uma gritaria dentro do trem, e
os quatro brutamontes se identificando como policiais pediam que todos ficassem
exatamente onde estavam e que tudo estava bem.
- Como bem? – uma senhora perguntou e
teve um cano de metralhadora encostado na sua cabeça e ouviu a seguir que
fizesse o favor de ficar calada, pois estava em curso uma ação antiterrorista.
Tonto e com uma dor de cabeça violenta, ele
tentava entender o que tinha feito, mas de nada adiantava porque lhe apertavam
a garganta de um modo que mal conseguia falar, que diria então falar.
Deitaram-no de bruços e o algemaram. A
mochila foi pega delicadamente e assim que o trem parou, foi colocada no chão,
num ponto isolado da plataforma, para que o esquadrão antibombas
providenciassem a verificação.
Ele saiu da estação carregado pelos
homens das forças de segurança e levado para as dependências da polícia
federal.
Mais tarde, dois homens que estavam no
mesmo vagão onde fora detido o suposto terrorista, assistiam aliviados o noticiário
num boteco qualquer. Tinham camisas do time adversário do Brasil e portavam-se
como verdadeiros turistas. Riam-se e cochichavam felizes, olhando a tevê,
enquanto o repórter informava sobre a prisão de um suspeito no metrô do Rio que
não era tão suspeito assim e as autoridades, publicamente, pediam desculpas.
Os dois tinham passaportes falsos e
levavam bombas nas suas malas.
Vestiam-se como pessoas normais e não
tinham comportamento suspeito.
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